sexta-feira, 29 de outubro de 2010

UMA PRÁTICA INCOMPATÍVEL COM A COPA

Foto flagrante de Canindé Soares (clique para ampliar)

Por Sheyla Azevedo e Marcelo Morais.
A vinda da Copa do Mundo em 2014 para Natal tem sido um dos baluartes para consagrar a ideia do progresso e, por sua vez, a ascensão do turismo e da geração de emprego e renda na capital e no seu entorno, a Grande Natal, que comporta quase a metade da população de todo o Estado. A princípio, não se tem como negar essas possibilidades, afinal trata-se de um evento mundialmente famoso que tem ajudado a espetacularizar e popularizar o futebol nos mais recônditos lugares do mundo. E a cidade terá o seu quinhão nessa grande festa. Mas, esse progresso é bom para quem?

A resposta poderia ser simples e direta: é bom para todos. Mas não é bem assim, quando se pensa no campo das ações. As obras estruturantes como construção de vias e o Estádio das Dunas, as capacitações profissionais e toda sorte de divulgação da cidade não são o suficiente para consolidar no pilar do progresso. Muito se fala em sustentabilidade e justiça social, mas pelo jeito as desigualdades vêm a cavalo. Aliás, figura de linguagem bem apropriada porque o objetivo desse artigo é falar sobre uma prática medieval que, infelizmente, ainda circula por Natal: o uso de animais de tração para carregar carroças. Até agora, sem nenhum tempo de controle ou disciplinamento por parte dos órgãos públicos e sanitários. O que torna a cidade um cartão postal do atraso, do descaso e do total desrespeito com esses animais, a sua maioria vítimas de maus-tratos e péssimas condições de sobrevivência.

E se o leitor acha que pode ser um exagero tais afirmações é adequado que tome conhecimento sobre o que pensa o veterinário sanitarista, William Bonfim, ex-diretor do Centro de Zoonoses da Secretaria Municipal de Saúde, profissional que há mais de 20 anos milita em causas sanitárias e preza pela boa convivência entre seres humanos e os outros seres vivos que habitam e dividem o mesmo espaço. Em entrevista concedida à Organização Não Governamental Au-Que-Mia, disponibilizada no You Tube, ele afirma que essa prática advinda de questões sociais e culturais – quando homens do campo migraram para os grandes centros - é incompatível com uma cidade que se pensa turística. É ele quem nos alerta para o fato de que somente cavalos, éguas e burros são animais compatíveis para carregar grandes pesos. Entretanto, jegues e jumentos – animais de menor porte – são frequentemente utilizados para o mesmo fim e vistos sendo açoitados, enquanto carregam grandes pesos, inclusive entulhos de construção civil. Na sua experiência clínica, até mesmo os primeiros têm graves problemas de saúde porque não são ferrados e apresentam calos que comprometem sua locomoção. Mas seus relatos vão muito além no que se refere a maus-tratos. O médico veterinário já viu cenas que considera como verdadeiras “atrocidades”: órgãos genitais amputados; fêmeas esfaqueadas porque não conseguiam trabalhar; outros com a língua esfacelada pelo arreio e alguns animais com a cauda queimada como “estímulo” para que eles pudessem se levantar para continuar a tarefa exaustiva. Durante sua gestão, Bonfim chegou a prospectar um projeto que previa albergues para esses animais maltratados. Mas a falta de previsão orçamentária deixou os planos no papel.

A maioria das pessoas não há de concordar com uma coisa dessas. Tampouco com as condições precárias – socialmente falando – em que vivem os carroceiros. Geralmente pessoas carentes de recursos financeiros, formação profissional e de informações acerca de legislação ou qualquer tipo de “progresso” que os insira no crescimento sustentável e na justiça social.

Para que a Copa 2014 seja realmente um advento promissor e gerador de divisas, é preciso que pensemos nos benefícios da cidade e para toda a população. E aí inclua-se na agenda da Copa, a definição de regras sérias e disciplinadoras para essa prática. Ou quem sabe, na melhor das hipóteses, extingui-la totalmente, dando melhores condições de sobrevivência tanto para os seres humanos, quanto para os animais, que merecem nosso respeito.

Publicado no dia 27 de Outubro de 2010.

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Para assistir a entrevista com William Bonfim no Youtube:


Leia mais:

Assine, divulgue o abaixo-assinado pelo fim da atividade dos animais de tração em Natal-RN:

2 comentários:

  1. Caro Blogueiro,
    Exite em Natal uma legislação específica sobre o transporte por tração animal.
    Há também um TAC assinado entre a Prefeitura do Natal e o Ministério Público para que a Prefeitura normatize, fiscalize e faça funcionar direito as carrocinhas, mas esse TAC nunca foi cumprido. Talvez seja interessante dar uma checada nisso.
    Vou procurar nos meus arquivos alguma coisa, se eu os achar pode ser interessante fazer alguma movimentação.
    Abraços e bos sorte.

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  2. Obrigado pelo contato. Essa informação é bem relevante, e caso consiga localizar nos seus arquivos, entre em contato conosco, pois é um recurso a mais nessa luta. Abraços, tudo de bom pra ti!

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