sexta-feira, 15 de outubro de 2010

UM DESAFIO PARA A COPA*

Carroceiro em atividade: uma atividade secular

Por Sheyla Azevedo

Numa época em que fazia matérias para televisão em 2006, certo dia passava pela Ponte de Igapó quando me deparei com um animal, um cavalo, agonizando nas margens daquele dinossauro de ferro. Visivelmente maltratado, sedento, faminto e cheio de escaras o animal sequer tinha forças para se levantar. Somente olhava fixa-mente para a gente, como se perguntasse o porquê de tanta crueldade e abandono. Não havia muito o que fazer e saí dali triste e desolada pois não tinha resposta alguma que aliviasse seu sofrimento, tampouco compreensão sobre uma atitude que leva um ser humano a fazer isso com outro ser vivo.

Mais de quatro anos se passaram e alguns setores da cidade vibram e exortam a real possibilidade de Natal vir a se tornar uma das 12 cidades-sede da Copa 2014. Situação que colocará a capital do elefante na rota do progresso definitivo e promissor. Algo em torno de R$ 6 bilhões a serem movimentados para obras de infra-estrutura e mobilidade urbana, com direito às polêmicas sobre de quem é paternidade e a maternidade do rebento ou se derruba ou não o famigerado Machadão. Sem contar outras promessas como a propalada formação profissional, com direito a dobrar a língua no vernáculo do To be or not to be, dentre outros planos.

Daí, me lembrando daquela cena de pouco mais de quatro anos atrás, com as que ainda são corriqueiras em 2010 de animais de tração sendo usados em carroças que circulam pelos corredores da cidade, dos quais, boa parte deles é visivelmente maltratada pelos seus "donos", carregando pesos (como entulhos da construção civil, por exemplo) que vão além de suas capacidades físicas, enquanto são açoitados, ou coisa pior, fico imaginando o que é que pensariam os milhares de turistas que deverão aportar na terrinha durante a Copa 2014 e - quem sabe até dentre eles, membros da comissão oficial da World Cup 2014 – se vissem a mesma cena? Que espécie de progresso e mobilidade urbana são esses que não preveem o disciplinamento ou - para o bem de todos - a extinção desse tipo de atividade que não é boa para os animais, nem para o carroceiro, geralmente pessoas carentes e sem qualificação profissional. E duvido que exista algum carroceiro por aí rico, bem de vida, com plano de saúde e pagando escola para os filhos. Estamos diante de um problema social e grave e que carece de urgente atenção.

As autoridades públicas e sanitárias, juntamente com a boa vontade de fazer de algumas ONGs precisam urgentemente pensar sobre o assunto. Fazer valer leis vigentes, criar outras e principalmente, gerar dotação orçamentária para resolver esses que também são desafios urbanos e dos mais relevantes para que uma cidade apresente condições de sediar uma Copa e seja considerada moderna.

*Artigo publicado no Novo Jornal no dia 15/10/10
 Sheyla Azevedo - azevedo.sheyla@gmail.com

Um comentário:

  1. Excelente artigo. Sinto que estas palavras estão representando as minhas e as de muitas outras pessoas que sentem a mesma indignação perante esta lamentável realidade. Espero que esta situação possa definitivamente ser revertida e que os direitos dos animais possam finalmente valer porque como ser humano, me recuso aceitar a idéia de que estamos evoluindo, visto que o homem ainda não aprendeu a respeitar nem a menor das espécies, que dirá o seu próximo.

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